segunda-feira, 28 de julho de 2008

Não contou a senha e foi preso


Na última quarta-feira, o prefeito Gavin Newsom, de San Francisco, entrou numa cela na delegacia policial no centro da cidade e gastou meia hora com um preso.

Terry Childs, funcionário público, estava detido já há dez dias. O prefeito ouviu atento todas as queixas que ele tinha para contar. Quando deixou a cadeia, carregava consigo três logins e uma senha. Childs continua preso para ser solto apenas quando alguém pagar a fiança de US$ 5 milhões de dólares.

É cinco vezes mais do que a fiança estabelecida habitualmente para assassinos presos em flagrante, na Califórnia.

Childs é administrador de sistemas. Era o responsável por todos os roteadores da FiberWAN, a rede municipal de San Francisco, na qual estão pendurados os e-mails do governo, os salários do funcionalismo, os arquivos criminais da polícia. Em suma: tudo. Segundo seus colegas, ninguém era melhor preparado do que ele. Um engenheiro altamente capacitado para lidar com roteadores Cisco, a principal marca no mercado.

Mas havia um detalhe: Childs era também o único que sabia as senhas. Sem ele, ninguém mexe na rede. Ela continua funcionando, mas se der um problema pára. Esse fato jamais incomodou nenhum de seus colegas.

Seus chefes imediatos, burocratas não técnicos, também não se preocuparam em cobrar-lhe algum tipo de documentação. Ironicamente, Childs tentou esboçar mais de uma vez uma política de segurança de sistemas escrita. Mas ninguém na hierarquia quis assinar um documento assim. E ele estava à disposição. Não tirava férias. Aceitava ligações a qualquer momento do dia ou da semana.

Até que um dia, e nesse tipo de história de terror sempre há um dia em que tudo muda, um novo encarregado de segurança de sistemas foi contratado. O novo homem começou a rever as redes da cidade, os servidores, e percebeu que para manter tudo de pé o município inteiro dependia de um só sujeito. Mais de sete milhões de pessoas. Se na hora do almoço Terry Childs fosse atropelado, fim.

O novo chefe procurou Childs e pediu-lhe as senhas. O administrador da rede municipal não as deu. Conforme a pressão para entregar essas senhas aumentava, Childs implantou sistemas de defesa nos roteadores para que apagassem suas configurações caso fossem invadidos. Só ele saberia reiniciar tudo. Perante a contínua recusa, a polícia foi convocada. Ameaçou prisão. Ele pagou para ver.

Até o fechamento desta edição, Terry Childs ainda estava preso e nenhum juiz havia sequer cogitado baixar sua fiança. Técnicos estavam testando as senhas que ele deu ao prefeito.

“O mundo é dos nerds”, comentou por aqui no Link um dos repórteres enquanto comentava a história de Childs. E é mesmo. Em momento algum o dedicado administrador de sistemas fez algum tipo de chantagem. Não pediu algo em troca das senhas. Apenas disse que não daria acesso a sua rede para quem não conhecia.

Prezado leitor, faça agora uma pausa. Olhe ao redor, veja sua vida. O banco que você freqüenta tem administradores de rede. A delegacia do bairro, também. A Receita Federal. Sua empresa. Não é apenas questão de proteger seus dados mais secretos. Essa é a parte fácil. Imagine a vida se, de repente, uma rede dessas parasse. Então imagine os pesadelos do responsável por esta rede.

Redes de grande porte como as de uma metrópole são brinquedos profundamente complexos. Não é qualquer garoto que sai da faculdade de informática que encara.
Administradores de redes os mais talentosos sã, por isso, quase sempre neuróticos. Eles conhecem os riscos, as idiossincrasias e as manhas de seu maquinário. Childs não vê a rede da cidade como algo público. Vê como algo que deve ser protegido de um mundo incompetente. Há mais deles por aí.

Fonte: Link - Estadão - por Pedro Dória

Complemento: há quem diga - inclusive eu - que, o fato acontecido com os brazucas nos dias 02 e 03 de Julho de 2008 - faço questão de guardar esta data para contos futuros - entitulado como "Pane complexa e demasiadamente técnica" foi arte de algum (ex) administrador da rede da Telefônica / Speddy, que talvez tenha sentido-se lesado de alguma forma. Cabe aqui a ética profissional... E nesse sentido e minha opnião a respeito é que Childs está certíssimo!

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